quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Gratidão

Por vezes dou por mim a pensar no impensável. Penso e repenso que o pensamento de hoje é diferente do pensam,ento de ontem, o qual, por sua vez, difere do pensamento de há uma semana e este ainda diverge do que pensava há um ano ou dois. Ainda, os sentimentos mudam, o olhar altera-se e a realidade dispersa-se, num caleidoscópio de sensações mutáveis de acordo com a idade, a era, a vivência e a envolvência.

Na infância tudo parece vibrante de energia. A curiosidade imensa mantém os sentidos em permanente alerta. O qê, porquê, como, quando, onde? Chega a ser saturante para que tem que "aturar" os petizes, sedentos de sabedoria e conhecimento do que os rodeia.

Um pouco mais tarde (no que parece ser uma eternidade, na altura, mas que agora sei serem apenas, quando muito, uma dúzia de anos) são as amizades da adolescência, as primeiras paixões assolapadas, o primeiro beijo e tudo o resto, tudo pela primeira vez. E que bem que sabe!!!! A antecipação do desconhecido, a projecção sobre a tela da imaginação e finalemnte a concretização, nem sempre condizente com o ansiado. Mas tudo é novo, tudo é fresco. A energia e vontade imensas fazem-nos sentir imortais, parece que vamos viver para sempre e que quando tivermos 30 anos será já o início da velhice.

Aos 30, afinal verificamos que não estamos assim tão velhos. Os rostos parecem mudar, não nos apetece fazer as mesmas coisas e o mundo parece ser outro. Na verdade, quem muda somos nós. Claro que o mundo à nossa volta não se mantém imutável, mas sem dúvida que a percepção que temos dele é agora, ao início da terceira década, diferente, muito diferente, ainda que possamos não ter verdadeira noção desse facto. Temos ainda bastante energia mas não estamos tão
disponíveis para a desperdiçar em correrias loucas. "A partir de agora é mais sopas e caldos de galinha", parecemos pensar. É uma idade perigosa, de transição, em que, ao deixarmos a louca juventude, receamos pela vida que aí vem. E seremos assim tão imortais?

Quarenta (40). A idade da mudança. Mudança de uma vida imortal para outra em que compreendemos a caducidade do que se insinuava perene. Aquela pequena dor que insiste em permanecer, a despeito das pomadas e comprimidos, a energia que falta para acompanharmos os mais miúdos, a falta de paciência para aturarmos imbecilidades. A constatação de
que a maior parte dos que julgávamos nossos amigos afinal se afastaram definitavamente. E começamos a sentir-nos sós, mesmo que acompanhados. Sensação estúpida e irracional.

Mas depois vem o deslubramento da realidade e a percepção de que, no meio do caos aparente, a realidade pode ser bela e cativante, bastando para isso ajustar a visão para um comprimento de onda mais, digamos, positivo. As desgraças e os problemas não desaparecem se os igoramos mas também não se resolvem se desesperarmos. E se
olharmos com atenção, com olhos de ver, como se usa dizer, verificamos que a nossa Casa é um berlinde azul recheado de maravilhas, conspurcadas, demasiadas vezes pela maldade e ganância humanas, mas que conseguem, ainda assim, maravilhar-nos com frequência. E depois, há as pessoas. Encontramos algumas pelo caminho que nos conseguem deixar felizes, ou infelizes, porque as pudemos conhecer. E aí, fechamos os olhos e agradecemos por tudo o que nos foi permitido ver e sentir, por todos aqueles que encontrámos pelo caminho, os bons e os maus, pois todos nos ensinaram a viver. E agradecemos especialmente àqueles que nos AJUDARAM a viver. Se é a família, se são os amigos, isso é irrelevante. São apenas palavras, o que importa são os gestos e o sentimento.... E isto é a vida, uma condição frágil e inconstante que um dia termina, para todos, sem dinstinção de credo, condição social ou cor política. Somos pó, somos água e aos elementos regrressaremos um dia...


Texto por Luis Ribeiro.....

As fotos acima foram premiadas no concurso de fotografia do Smithsonian de 2012.

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